Os chutes, os
socos e as joelhadas dessa luta trazem mais benefícios do que muita
gente imagina e podem ser praticados por todas as faixas etárias.
Por Manoel Gomes | design Pilker | fotos Omar Paixão
Datada
de 1909, a letra do Hino Nacional diz muito sobre o brasileiro. Numa de
suas estrofes, enaltece a garra de um povo sofrido e valente: "Verás
que um filho teu não foge à luta". Mais de um século depois da criação
desse símbolo pátrio, um esporte da Tailândia, no sudeste asiático, cai
no gosto popular e invade definitivamente as academias de todo o país.
Estamos falando do muay thai, que traz vantagens dos pés à cabeça.
Também
conhecida como boxe tailandês, essa arte marcial utiliza oito armas de
combate: punhos, cotovelos, joelhos e canelas. Com diversos aficionados
mundo afora, é reconhecida como uma das lutas mais difundidas, com
campeonatos, federações organizadas e muitos atletas profissionais mundo
afora. No Brasil, porém, a modalidade só ganhou destaque mais
recentemente, com a adesão de celebridades do meio artístico.
Apresentadoras e atrizes passaram a creditar ao esporte o corpo
escultural e a saúde de ferro.
A publicidade nem sempre foi tão
favorável assim. Há alguns anos, a falta de informação afastava
possíveis praticantes. "O aluno sempre me pergunta na primeira aula se
vai apanhar no treino. Isso não existe", esclarece o educador físico
José Danielton, personal fighter da equipe JD, em São Paulo. Segundo
ele, havia conceitos errôneos sobre a luta, que muitas vezes era
retratada como um exercício brutal. "Quando alguns famosos começaram a
treinar muay thai, aumentou a procura e diminuiu a desinformação",
completa.
As aulas duram entre uma hora e 90 minutos e se
destacam pelo dinamismo e divertimento. Diferentemente da musculação,
que prima por séries repetitivas, os treinos do muay thai envolvem
rotinas diversas de golpes e outros exercícios físicos, como corrida,
flexões e abdominais. "Essas atividades aeróbicas melhoram o
condicionamento físico e fortalecem toda a musculatura", explica o
mestre Nelsimar dos Santos, presidente da Federação de Muaythai
Tradicional do Estado do Rio de Janeiro. Vale acrescentar o ganho
psicológico da prática marcial. "Quando você consegue enfrentar um
adversário dentro das regras da luta, fica mais fácil encarar a sua
vida, o desafio de uma faculdade, de um relacionamento, do trabalho",
enaltece José Danielton.
A prática de muay thai é permitida para
a maioria das pessoas. Normalmente, problemas de saúde não impedem a
inscrição nas aulas da arte marcial tailandesa. Mas, antes de começar
qualquer atividade física, é importante procurar um médico e realizar
uma boa avaliação. "As academias que fazem um trabalho consciente cobram
um atestado de seus alunos ou possuem um profissional para fazer esse
checkup", conta Nelsimar dos Santos, que também é presidente do Conselho
Brasileiro de Mestres de Muay Thai.
Mesmo com tudo em ordem,
alguns cuidados básicos sempre evitam lesões, principalmente nas
primeiras sessões de treinamento. Um estudo realizado pelo Hospital
Comunitário Withington, de Manchester, na Inglaterra, mostra que os
machucados são bem mais comuns em lutadores iniciantes do que naqueles
com mais tempo de ringue. Isso se deve à ânsia de evoluir rapidamente e
se tornar um mestre antes da hora.
Para afastar os perrengues
físicos, nada melhor do que atentar para as orientações do professor e,
paralelamente, procurar uma dieta equilibrada. "Além disso, não se deve
fazer a atividade com dúvidas. Chamar o instrutor para verificar se o
movimento está certo nunca é demais", conta o educador físico Fabrício
Boscolo Del Vecchio, professor da Escola Superior de Educação Física da
Universidade Federal de Pelotas, no interior do Rio Grande do Sul.
A
musculação não é um empecilho para os chutes, jabs e diretos do muay
thai. Aliás, muitas vezes serve de complemento. "Uma atividade ajuda a
outra. Os exercícios de academia potencializam os golpes e auxiliam o
praticante a aguentar as investidas dos oponentes", opina o mestre André
Gomes, da Federação Paulista de Muay Thai. Quem resolve praticar as
duas modalidades deve ficar ainda mais de olho na alimentação,
procurando o auxílio de um nutricionista esportivo, e também caprichar
no aquecimento, já que as cargas exigidas serão praticamente duplicadas.
Para começar os treinamentos, o aluno precisa adquirir certos
materiais. É o caso de bermuda, luvas, ataduras, caneleiras e protetor
de boca (veja os instrumentos básicos abaixo).
Algumas academias podem até emprestar esses equipamentos, mas o ideal é
que cada um tenha o seu. "Já que muitas vezes esse material é
compartilhado, o praticante deve dar preferência a uma escola que seja
limpa, organizada, com um sistema de higienização constante", sugere Del
Vecchio.
Outra dica para quem se interessou pelo muay thai é
assistir a uma ou duas aulas antes de fazer a matrícula. Conversar com
outros praticantes e saber mais sobre o professor também contribui
bastante para evitar que a luta pacífica vire briga agressiva. Por fim,
descubra se o mestre é afiliado a alguma federação ou confederação —
dado fundamental. Ora, isso é um certificado de que ele segue diretrizes
e tem um pensamento alinhado com o que há de mais sadio no esporte: o
desenvolvimento pleno das ações humanas.
Uma arte milenar Ela
surgiu quando multidões de chineses abandonaram o país à procura de
terras férteis, há 2 200 anos, e criaram povoados em áreas da atual
Tailândia. Mas, ali também, passaram a sofrer perseguições de
malfeitores e outros invasores. Assim, nasceu o muay thai, que, em bom
tailandês, significa luta pela liberdade. A ideia era imobilizar o
adversário sem feri-lo mortalmente
Berço do MMA O
Mixed Martial Arts (Artes Marciais Mistas, em tradução livre) é um dos
esportes mais comentados do momento. Os lutadores misturam diversas
modalidades de luta, e, entre elas, destacase a personagem principal de
nossa reportagem. "Anderson Silva, Vanderlei Silva e Shogun, grandes
atletas brasileiros do MMA, foram campeões fazendo uso do muay thai",
destaca o professor José Danielton.
E a criançada?
Muitos
pais ficam em dúvida se esportes tidos como mais agressivos, caso do
muay thai, são seguros para seus filhos. "O essencial é a atividade
física antes dos 10 anos nunca perder o caráter lúdico, de brincadeira",
esclarece o psicólogo João Ricardo Cozac, presidente da Associação
Paulista da Psicologia do Esporte. A ideia é possibilitar ao pequeno o
maior número possível de modalidades esportivas, sempre lembrando que
elas devem ser abordadas pelo lado do prazer e da diversão. A competição
séria deve ficar para mais tarde, na adolescência.
Os seis benefícios 1 -
O suadouro garante a queima de muita energia. Dependendo do estágio e
do preparo físico, o gasto chega até a 1 500 calorias por aula. Segundo
os especialistas, a média de iniciantes fica na casa de 750 calorias por
sessão.
2 - O coração sai ganhando: os chutes e
os socos dilatam os vasos sanguíneos. Daí mais oxigênio e nutrientes
passeiam pelo corpo. As câmaras cardíacas, exigidas, ficam fortes.
3 -
Os músculos também se beneficiam. Mas, diversamente de outros
exercícios localizados, o muay thai prepara o corpo de uma forma global.
Há um aumento do tônus e da resistência muscular.
4 -
O treinamento exige bastante da região central do corpo, principalmente
do core, grupo de músculos situados no abdômen que dá sustentação à
coluna vertebral. O core fortalecido garante uma ótima postura.
5 -
Os golpes estimulam a amplitude dos movimentos, o que requer um bocado
de precisão e elasticidade. A coordenação motora e a flexibilidade são
aprimoradas — até mesmo nas tarefas do dia a dia.
6 -
O boxe tailandês traz inúmeras benesses à cabeça. Além de extravasar a
tensão, o muay thai ajuda seus praticantes a encarar os desafios. As
aulas também são ótimas para a socialização.